By Luís Alves Monteiro, Senior Advisor, Boyden Portugal

“Chamo a vossa atenção para um artigo bastante lúcido do Eng.º Luís Alves Monteiro, ex. Partner e atual Senior Adviser da Boyden Portugal, publicado na revista INGENIUM da Ordem dos Engenheiros. O artigo aborda as fragilidades e a perda de competitividade relativa da nossa economia na União Europeia e, sabiamente, aponta a reindustrialização como um caminho obrigatório, bem como um conjunto de possíveis medidas associadas que permitam transformar o círculo vicioso em que nos encontramos num círculo virtuoso.”
Luis Melo, Managing Partner, Boyden Portugal

1. Portugal está confrontado com uma dívida pública não suportável no médio/longo prazo e em crescendo, pois a permanência dos défices no Orçamento do Estado, por menores que sejam, significam aumento da dívida, situação esta agravada pela base competitiva limitada em resultado de uma economia que vem regredindo nos últimos vinte anos em termos do PIB per capita quando comparado com os seus concorrentes europeus.

Tudo isto origina que não tenhamos qualquer margem de manobra que resista a choques externos derivados do comportamento errático dos mercados. Apenas o nível baixo das taxas de juro de que o mercado internacional tem beneficiado, também em resultado das políticas monetárias adotadas pelo BCE, permite que o nosso serviço de dívida não atinja valores incomportáveis face ao desempenho deficiente da nossa economia.

No contexto europeu, Portugal passou, segundo dados da Pordata quanto ao PIB per capita expresso em paridades de poder de compra (PPS), da 15.ª posição no ano 2000 para a 19.ª em 2019, sendo ultrapassado por Malta, República Checa, Eslovénia, Estónia e Lituânia, registando no final deste período um PIB per capita em PPS de 24,4 mil euros que compara com 31,1 mil euros registado na média da União Europeia.

2. A crise pandémica que tem assolado o Mundo origina novos problemas naquilo que é mais precioso para todos nós, a vida, criando maiores dificuldades aos mais desfavorecidos, situação a que devemos acorrer com total prioridade e que confronta a economia com novos desafios até então desconhecidos. A situação das famílias e das empresas tem tido a resposta possível por parte dos Estados, com alguma disponibilidade de liquidez injetada na economia, tentando compensar a quebra de rendimentos que esta situação nos tem criado pelo encerramento forçado de setores económicos extensos, alguns deles, duramente atingidos por esta crise sanitária.

3. É, pois, nesta fase que julgo apropriado ser definido um Programa Genérico Específico de fácil interpretação e bem percetível pelos destinatários, que seriam prioritariamente as empresas, definindo três ou quatro grandes objetivos integrando políticas públicas de estímulo poderoso ao investimento e ao reforço da competitividade da economia para que no período de 2021 a 2027 o País possa superar os grandes constrangimentos com que se irá debater nos domínios social, económico, financeiro, empresarial, da coesão territorial, visando o bem-estar dos portugueses, melhorando a sua qualidade de vida.

4. Assim, em linha com o que o Presidente da República Francesa, Emmanuel Macron, transmitiu, sugeria que, destinado às empresas e gerido pelo Ministério da Economia, que dispõe de unidades orgânicas muito experientes e competentes na conceção, na gestão e avaliação deste tipo de programas, fosse desenvolvido, num prazo curto, um Programa de Reindustrialização Específico dando resposta aos anseios e expetativas empresariais.

Recordo aqui Michael Porter, que elaborou detalhadamente o quanto para a riqueza das nações são decisivas a qualidade das empresas que as integram, para assegurar o crescimento do produto, do emprego melhor remunerado e da qualidade de vida. Foi nesta linha que o Presidente Macron definiu um programa a lançar, orçamentado em 100 mil milhões de euros, com as seguintes prioridades:

| Reconquistar o setor industrial;

| Garantir a transição energética;

| Criar empregos.
 

5. Relativamente ao nosso País, julgo que se deveria adotar um Programa de Reindustrialização com a sua gestão a cargo do Ministério da Economia, integrando o orçamento e as medidas previstas para as empresas no Plano de Recuperação e Resiliência, para além de outras medidas que, de forma massiva, respondam a este novo desafio com que estamos confrontados e que vigorariam de 2021 até 2027, dando uma especial atenção à criação de empresas e à modernização das existentes, e à atração de investimento estrangeiro com alto valor acrescentado nacional e tecnologicamente evoluído, que beneficie as empresas nacionais potencialmente fornecedoras. Apontaria para este Programa os seguintes objetivos:

| Recuperação e crescimento da competitividade empresarial, estimulando investimentos empresariais visando, por fusões e aquisições, o aumento de escala das nossas micro empresas e das PME, apoio a investimentos de modernização em empresas produzindo bens transacionáveis e apoios de forma massiva a startups com elevado conteúdo tecnológico;

| Promoção da transição energética, da transição digital e da recuperação ambiental;

| Criação e manutenção do emprego, estimulando o reforço das competências pela formação, incluindo a técnico-profissional e politécnica, e criando as melhores condições para o crescimento do rendimento das famílias e do seu bem-estar;

| Promoção de projetos de infraestruturas de base e tecnológicas, com especial prioridade a parques industriais no interior do País, dinamizados pela iniciativa dos representantes autárquicos.

Quanto aos apoios a conceder, recomendaria, consoante os casos, que pudessem ser com incentivos financeiros a fundo perdido ou reembolsável, e também fiscais, reeditando o CFI – Crédito Fiscal por Investimento, que tão bons resultados alcançou no passado, estimulando o investimento produtivo das empresas, agora com a possibilidade de a receita cessante poder ser compensada com fundos estruturais, em caso de a União Europeia concordar com a proposta que, nesse sentido, teria de ser formalizada pelas autoridades portuguesas.

6. Faria de seguida uma breve referência à importância do Banco Português de Fomento, herdeiro do nome de um banco de boa memória pelos relevantes serviços prestados à economia nacional e que resultou dos fundos do Plano Marshall, com a designação, primeiro, de Fundo de Fomento Nacional e, mais tarde, de Banco de Fomento Nacional, e que tinha como objetivo apoiar a reconstrução, ao tempo, da economia nacional apoiando essencialmente projetos de raiz, públicos e privados, e sendo um ator decisivo no escrutínio dos investimentos que integravam os designados Planos de Fomento.

Mais tarde, com a simultânea gestão do Fundo EFTA para o Desenvolvimento Industrial de Portugal, entidade promovida por Per Kepple, ao tempo Ministro das Finanças da Noruega, e posteriormente com os apoios do Banco Mundial, IFC, BEI e KFW, desenvolvendo na avaliação dos projetos as metodologias de Lyn Squire e H. van der Tak, o Banco de Fomento Nacional mereceu a integral confiança desses bancos multilaterais e, com isso, beneficiou a economia portuguesa.

No caso atual do Banco Português de Fomento, e partindo do princípio que irá ter como atividades as que estavam a cargo das sociedades que o passaram a integrar, levanto dúvidas, desde já, sobre o facto de uma mesma instituição bancária, para além de conceder crédito direto e por assinatura, estar capacitada também a desenvolver a atividade de capital de risco, o que não considero adequado, tanto por justificar uma abordagem e acompanhamento distinto da concessão do crédito, quer por recomendar que os profissionais encarregues destas operações disponham de conhecimentos e sensibilidades distintas das que são necessárias à concessão do crédito, seja qual for a modalidade, tendo os gestores e decisores de capital de risco que ter características apuradas de recetividade e gestão do conceito de empreendedorismo.

Mais prudente seria que o capital de risco se mantivesse autónomo na PME Investimentos ainda que o capital desta sociedade fosse totalmente detido pelo Banco Português de Fomento.

7. Há, no entanto, problemas estruturais que muito condicionam o País, e que se mantêm, sem serem encarados com a coragem necessária para serem superados. Constam do Global Competitiveness Report de 2019, são a causa de algumas das fragilidades da nossa economia e do incorreto funcionamento das instituições e, por isso, deveriam merecer uma nossa especial atenção. Sublinharia os seguintes:

| Má qualidade da regulação económica;

| Baixa eficiência do sistema judicial;

| Pouca solidez do sistema bancário;

| Pouco progresso tecnológico;

| Baixa taxa de investimento;

| Baixa escolaridade média.

Conviria, assim, que se criassem as necessárias condições para que se concretizassem as reformas adequadas para que, de uma vez por todas, pudesse o País atingir os níveis de competitividade que todos gostaríamos que fossem atingidos.

Para ler a edição inteira do Ingenium como um pdf, por favor clique aqui

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